O clima está pesado. Mesmo que seja outono e que o dia esteja ensolarado. O céu azul e com algumas nuvenzinhas. Não faz diferença. O humor não é bom. É como se nuvens pesadas estivessem tomando conta de tudo. Alguns amigos estão nervosos. Com muita raiva mesmo. Vivenciam esta raiva nas redes sociais. O tom é acusatório, mesmo na defesa de bons valores. Sofrem com tudo isso. E querem justiça.
Outros amigos também estão nervosos. Os motivos são os mesmos. Mas, o viés é outro. Desejam justiça. E acusam nas redes sociais uma enorme dor porque tudo é perseguição, tudo é falsidade, tudo é armação. Nada soa verdadeiro.
Gritam em letras maiúsculas. Postam vídeos acusatórios. Descobrem coisas que podem ou não terem ocorrido. Mas, não faz diferença se forem verdadeiras ou não. Importa a manchete. Importa o impacto. Importa atingir o outro.
E criam-se heróis, um por semana, um por dia, um por hora, mesmo sem saber se o herói criado deseja mesmo o bem da nação ou se é mais um fanfarrão que vai ser denunciado ali na frente como um salafrário qualquer como tantos outros que algum dia desses recebeu o nobre título de “este me representa”.
Jamais poderíamos imaginar, nem aqueles mais criativos, que um recurso no STF viraria assunto de boteco. Que a análise feita por um membro da alta corte sobre a atuação de seus pares viralizasse na rede. Que alguns vizinhos, amigos e familiares, que conviveram por anos, por décadas, em respeitosa desarmonia definitivamente quebrassem pratos por causa de um pronunciamento de algum magistrado nos autos de um processo que poucos têm acesso, mas que todos sabem quase tudo porque seletivamente “tudo” vaza.
E na noite, enquanto uma chuva fina caía sobre a capital, um grupo defendendo a moral, os bons costumes, grita palavras de ordem dentro de um clube de jazz acabando com a paz e com a harmonia. E, não atendendo aos pedidos do garçom, partem e quebram-lhe a cara. E agridem outro que tentava separar a contenda. Quando fica perigoso ouvir um bom jazz é porque a coisa realmente fugiu ao controle. O Brasil está doente. A doença não é a direita nem a esquerda. A doença é a paixão. O sentimento obsessivo, arraigado, a luta radical e a vontade de eliminar o outro. É o ódio que cega e contagia. E a cegueira é falta de luz. Está faltando luz no país.
A história, esta senhorinha que vive do passado e conta coisas sobre gente que já foi um dia, vai se deliciar num futuro muito próximo quando as análises serão mais serenas e as paixões não estiverem tão afloradas. E os erros e acertos serão estudados por alunos nem muito interessados.