Uma
voz e um violão. Assim lembrava dela. Os cabelos eram cacheados.
Longos. Jeito de menina. Moleca. “Olha a lua mansa se derramar (me
leva amor)/ao luar descansa meu caminhar (amor)/meu olhar em festa se
fez feliz (me leva amor)/lembrando a seresta que um dia eu fiz(por
onde for quero ser seu par)”. Assim cantou uma noite numa das aulas
de literatura. Andanças, de Paulinho Tapajós, Danilo Caymmi e
Edmundo Souto, imortalizada por Beth Carvalho, que conheci num desses
tantos trabalhos de grupo que se apresentavam na sala de aula.
Fazia
tempos que não a via. Mentira: na verdade, a enxergava com
frequência, mas sempre nas redes sociais, o que, convenhamos, às
vezes é quase o mesmo que não ver. Enfim, encontrei minha querida
colega de faculdade. “Trinta anos então”, pensei. Ela nem só
pensou como disse. Magda pediu um café coado. A água quente
passando pelo pequeno saquinho de tecido caindo aos poucos na xícara
desperta uma certa magia. O cheiro de um só café enche o ambiente
pequeno e acolhedor. Eu pedi uma água mineral. Com gás. O máximo
da magia que consegui foi o som do gás fugindo quando a tampa foi
desenroscada. Pouca coisa.
Estranho
esta sensação de ver alguém depois de lapso temporal tão grande.
Três décadas não são três dias diria um amigo meu que para tudo
que acontece ao redor tem uma frase pronta, um clichê. A faculdade
mudou. Muito. Os corredores nem ao menos são os mesmos. As pessoas
que atuam ali também não são. Nós, da mesma forma, somos outros.
Mais vividos. Mas, vivos.
Foram
poucos os minutos ali enquanto o café era consumido. Onde anda? Como
tá? Lembra disso, daquilo? E os dias de hoje? Ah, os dias de hoje
são punks. Doidões como nunca se pensou. Loucos como nunca se
planejou. “Às vezes é difícil escrever. Às vezes é difícil
entender”. De todo o pouco que se falou, que se questionou, que se
ouviu sobrou uma certeza: está cada vez mais difícil compartilhar
um café e conversar sem atropelos, sem medo de expor ideias. As
pessoas, em regra, impregnadas pelo espírito do embate das redes
sociais, pouco sentem satisfação em ouvir.
Pensando
nisso, lançamos no mês de março um suplemento no Jornal Bons
Ventos chamado Mundo das Ideias. O nome é pretensioso. Mas, a
intenção sempre foi uma só: criar um espaço para a geração de
conteúdo que possa ser digerido numa cafeteria ou mesmo na boca de
um fogão nestes dias frios que insistem em gelar os corpos dos que
aqui vivem. Tem agradado. Magda Altafini, psicopedagoga, apreciadora
de uma boa música e de um bom café, é uma das que contribuem com
seus inspirados escritos. O poeta Delalves Costa também é habitué.
Jerri Almeida, Fabiano de Souza Marques fazem parte do time. Marcelo
Alacarini, Marcelo Reis e a jornalista Gabriela Prestes já
contribuíram. Outros aparecerão em breve. Nos próximos dias outra
edição será lançada porque escrever é preciso.
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