Falar sobre o futuro é uma armadilha. Ele é incerto. Depende do que
se fez ontem e do que se está fazendo hoje. Então, não é um ser
autônomo. E, além disso, é fugidio, pois quando chega já não é
mais o futuro e sim o hoje. Ele é sempre o que está por vir. De uma
hora para a outra vira o ontem.
Num
passado mais ou menos distante, uma das técnicas usadas para
garantir a audiência das novelas globais era, ao final de cada
exibição, apresentar as cenas dos próximos capítulos. Eram hábeis
os editores. Mostravam rápidas cenas, escondendo o essencial. Não
existia ainda o spoiler, que veio a ser instituído muito depois, no
entanto, havia perspicácia suficiente para garantir que o noveleiro
espiasse somente o necessário para manter seu vício.
Não
assisto novela há décadas. Nem sei se usam deste artifício. Creio
que não, pois os tempos são outros e, hoje em dia, os resumos de
novelas estão à disposição nos sites especializados na internet.
De
qualquer modo, é instigante, é sedutora esta tendência por saber o
que ocorrerá ali na frente. Ainda mais quando praticamente todos os
seres humanos tiveram um sobressalto extraordinário diante da
necessidade de reduzir, através do isolamento social, o avanço do
apressado Coronavírus. Não é necessário ser futurólogo para
antecipar que este momento marcará uma geração inteira e
concretizará mudanças significativas nas relações sociais, na
economia, na política e nas famílias.
O
exercício feito por alguns especialistas já adiantam que o mundo
não será mais o mesmo a partir do fim da pandemia. Mesmo que as
cenas não estejam ainda editadas, alguns já preveem mudanças
significativas no modo de vida das pessoas. A escola que, até então,
lidava com muita dificuldade com as tecnologias vai obrigatoriamente
instituir um maior aproveitamento do ensino à distância. As escolas
particulares já vinham se adaptando a isso. Na verdade vinham
engatinhando. Agora, diante da necessidade, o processo foi acelerado
e não haverá retorno. As escolas públicas, no entanto, hoje
paupérrimas em termos de recursos é que devem sofrer as maiores
mudanças.
Outra
aposta é na valorização das relações, especialmente nos laços
familiares. E isto ocorrerá com certa euforia. Uma represada alegria
e manifestará diante do encontro, do abraço, do retorno ao almoço
dominical, do café da tarde, da pizza compartilhada e das festas de
aniversário que passaram em branco nos meses do isolamento. Estas
coisas comuns e corriqueiras voltarão a ser valorizadas.
As
mudanças não param por aí. Há desafios enormes pela frente. Um
deles, talvez um dos maiores, será a questão econômica,
especialmente a do desemprego. Se o problema já era crescente no
Brasil e em várias partes do planeta(com milhões de pessoas na
informalidade e longe dos postos de trabalho), a tendência é de que
aumente muito mais. Para os mais pessimistas, o fosso entre os que
têm muito e os que pouco têm crescerá ainda mais.
O
futuro, como disse, está sendo construído. O planeta já não é
mais o mesmo. O breque violento deixará marcas. Algumas delas muito
fortes. Outras nem tanto. Resta a torcida para que os nossos possam
se reunir ali na frente para contar suas histórias e o que tudo isso
significou em termos de aprendizado. Muitas famílias já estão
desfalcadas. Sentem hoje na pele a transformação da vida em um mero
número estatístico. Que sejamos poupados desse capítulo.
Pois bem nobre, há quem viva sempre querendo saber as cenas dos próximos capítulos da vida, num ansiedade quase incontrolável. É o medo do incerto. Tens razão, esta pandemia já nos faz exercer a disciplina de viver um dia de cada vez.
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