Quando
sua moto vinha em direção à minha casa disparava um sinal. Os
cachorros se assanhavam com chuva ou com sol. Corriam para a frente e
latiam anunciando a chegada de notícias novinhas em folha. O jornal
era arremessado apressadamente pelo entregador. Pegava o exemplar
que, nos dias de chuva, vinha estrategicamente colocado dentro de um
saquinho plástico. Depois, era tomar um café folhando o diário de
trás para a frente. Primeiro o esporte e suas minúcias por vezes
desinteressantes, depois as coisas mais sérias como a política, a
economia, o caderno de cultura e a geral.
Era
um ritual. Uma folheada no jornal e um gole de café. Uma passagem de
olhos rapidamente para descobrir os temas mais importantes e outro
gole. No fim, a xícara se esvaziava e o jornal ainda tinha conteúdo
para ser consumido. Hora de renovar. Mais uma dose.
Com
o tempo os costumes mudam. O conteúdo do jornal impresso está todo
na internet. Está no celular. Mas, é muito diferente. O smartphone
é frio. E exigente. O papel é estático. Fica ali à disposição.
A tela não. Ela brilha. Os aplicativos vão sendo atualizados
rapidamente. Notificação de notícia. Amigão atualizou o story.
Fulano reclamou do juiz que meteu a mão sem piedade e sem vergonha.
“Cadê o VAR?”. O WhatsApp não perdoa. O café que espere.
Foi-se o ritual.
O
celular é o cara. Café esfria, almoço esfria. Filho sorri. Mas, a
mensagem recebida agora tem que ser respondida na hora. “Ora essa,
online e não me responde… Como assim?”
“Como
está o tempo hoje? Vai chover? Vai fazer frio? Que roupa uso? Vou
dar uma olhadinha no aplicativo e já decido”. Meia hora depois de
atualizar Facebook, WhatsApp, Instagram, Google, curtir,
compartilhar, postar uma mensagem relevante, bisbilhotar aqui e ali
etc etc etc etc. “O que eu queria mesmo?”.
Quantidade
e qualidade
Se
por um lado as comunicações instantâneas, via rede social,
incrementaram a quantidade de informações compartilhadas, por
outro, nota-se total descontrole sobre a qualidade deste conteúdo.
As cartas estão embaralhadas de tal forma que o desavisado não sabe
mais o que é verdadeiro e o que é fictício. Este panorama, de
algum modo, favorece quem está no comando da barca. Afinal,
informações falsas e verdadeiras se misturam criando um ambiente de
pouca nitidez e de lucidez quase ausente. No meio da desinformação
o vivente pode continuar crente ou descrente. Na dúvida não reage.
O que é bom para quem assim deseja.
O
desavisado é vítima. Porém, há muita malícia no ar. Há grupos,
hoje identificados como milicianos, extrema direita ou denominações
outras, que criam verdadeiras guerras na internet compartilhando
“notícias” falsas e enchendo as postagens com comentários
raivosos ou, ainda, defendo o indefensável. Criam climas bélicos
que só favorece aqueles que se dedicam à guerra. Quem é da paz, do
amor e da harmonia ou faz de conta e não retruca ou se afasta dos
centro da arena. Em todos os casos, perde-se uma bela oportunidade de
comunicar coisas construtivas.
Titico
Partiu,
nesta semana, o José Adair. Titico, como era conhecido na cidade e
na região, era um sujeito ímpar. Bom de papo, atento, dedicado,
colorado e torcedor do GAO. Muitas e muitas vezes
prestou seu apoio às iniciativas esportivas que empreendi há alguns
anos quando envolvia jovens e adolescentes. Faz alguns pares
de dias,
passando em frente da sua
loja,
parabenizou-me por uma
crônica sobre os tempos de ontem onde destacava as brincadeiras
infantis de ontem e os tempos de hoje, tão baseados na tecnologia.
“Não
se trata de serem melhores ou piores, os dias de ontem não se
repetirão jamais”, encerrava
a crônica.
Bem apanhado Solano.
ResponderExcluirPois, como dizem divertidamente meus filhos, sou velho, gosto e cultivo pequenos rituais e rotinas. Precisamos disso para pontos de equilíbrio. Esse mundo de frases soltas fazem-nos perder muito.
Caro Marcelo: é do gênero humano o cultivo de pequenos rituais. De certo modo isto dá alguma segurança. Os tempos de hoje, porém, estão aí a suplantar as coisas mais velhas substituindo por outras mais dinâmicas tornando tudo bem mais rápido. É a vida. Abraços!
ExcluirSei lá, estou ficando velho. Ainda gosto de ler "jornal de papel", livro de papel. Tá, sei, papel... árvores ....mas eu gosto de folhear. Livro novo, uuhmmm que delícia. O cheiro, as folhas intactas. E o café? Complemento quase indispensável. Prazeres de um velhote.
ResponderExcluirCaro Ênio: é inegável que os rituais estabelecidos ao longo dos tempos são significativos, pois carregam nossas marcas existenciais. No entanto, os novos tempos têm, de algum modo, contribuído para que nossos passos mudem em algumas áreas até então impensáveis. Abraços!
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