Enquanto a dor, o sofrimento e a comoção tomavam conta de todo o país num domingo cinza; enquanto milhares de voluntários arregaçavam as mangas para atender as vítimas e seus familiares; enquanto milhões de pessoas incrédulas assistiam as fortes cenas da boate Kiss em chamas; enquanto muitos internautas tentavam de alguma forma contribuir, parte pequena e ruidosa mostrava total alienação e falta de comprometimento para com a tragédia alheia.
Escondidos atrás de suas máquinas, inconsequentes e insensíveis navegadores lançavam sujos comentários. Uma menina achava graça de tudo. Rude, grosseira, deselegante brincava com o hábito gaúcho de fazer churrasco aos domingos. Talvez algum soldado nazista, cumprindo as ordens emanadas pelo tirano, tenha em algum momento sentido mais compaixão do que ela.
Não demorou para que alguém, apressado, rancoroso e insensível ligasse a morte dos estudantes aos desmandos políticos da nação, aos “mensaleiros” e ao ex-presidente Lula. A pressa demonstrada por alguns era tão grande em agredir que nem a atitude da presidente Dilma, que deixou encontro de presidentes e se deslocou com presteza até Santa Maria, foi poupada. Aquilo que se vê de admirável, de humano no presidente Barack Obama, que suspende sua agenda em casos de comoção e se desloca até o local da tragédia para prestar solidariedade, em Dilma é aproveitamento político.
O querido amigo Luís Henrique Benfica, atento a tudo na redação da RBS, estranhando a quantidade de comentários inapropriados e desumanos durante todo o domingo cinza nas redes sociais, postou no Face questionamento sobre tudo isso: “Será que estou louco?”. Não, não estamos loucos, respondo.
Democrática como é, a internet dá voz a quem não deve ser ouvido. Dá notoriedade a quem não deve ser notado. Tudo vira motivo de piada. Cérebros inábeis transformam coisas sérias em meros gracejos. Assuntos densos viram brincadeirinha infantil. A galhofa por vezes é o tom. Nem mesmo a medida sensata e responsável da suspensão temporária do Planeta Atlântida, que seria realizado no próximo final de semana, passou incólume. Um que outro lembrava os arranjos feitos no trabalho e os esforços necessários para a compra do ingresso. “Quem pagará o meu prejuízo?”, perguntava com ansiedade.
Apesar dos desatinos de alguns, que causam desconforto e desconfiança em relação aos limites do homem, é importante ressaltar que, nos momentos cruciais, como nas tragédias como esta de Santa Maria, parte mais significativa do gênero humano demonstra que no seu íntimo residem os sentimentos de pesar, de compaixão, de solidariedade e de cumplicidade prontos a serem libertados diante da necessidade.
Ninguém conseguirá amainar a dor dos que perderam seus filhos, seus familiares e amigos. Porém, todos poderão contribuir silenciosa e respeitosamente com um pensamento, com uma oração, uma prece pelos pais que sofrem e por todos os filhos que partiram.
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