11/01/2013

Os melhores momentos

Houve um tempo em que os jogos de futebol, inclusive as decisões dos estaduais, não eram transmitidos pela tevê. As redes de televisão filmavam os jogos e os apresentavam no final da noite. Durante à tarde, os torcedores tornavam-se reféns dos locutores de rádio. Os narradores, na ânsia em tornar as contendas ainda mais emocionantes, transformavam qualquer chutão em perigo de gol. "A bola passou raspando" dizia o narrador. A visão do torcedor criava a imagem da bola viajando perigosamente a alguns milímetros da trave. Sofrimento em vão: na realidade a proximidade nem era tão grande.
A tevê avisava solenemente: "Assista ao vídeo tape completo do clássico decisivo, hoje, às 10h30min da noite!". Como chamamento apresentava alguns poucos lances do jogo, os melhores momentos. Todas as emoções ficariam para mais tarde.
Os jogos hoje estão na tevê. Nem só os jogos, algumas emissoras gastam um tempão com os treinos. Discutem longamente a parte tática, as possíveis soluções que os treinadores poderão utilizar. Enfim, o futebol foi devassado. Tudo está na tevê. O torcedor já não precisa esperar até o final da noite. O jogo tá na tevê, no site, no blog. Está em todos os cantos. Até no rádio.
O mesmo está ocorrendo com as fotos. Houve um tempo, o mesmo em que o futebol não era transmitido ao vivo, em que fotografias (ou retratos) solenemente guardavam os momentos especiais. Para gastar um pose era necessário certo preparo. Primeiro haveria de se ter uma máquina fotográfica. Eram caras e poucos recursos tinham. Algumas, na realidade, não contavam com recursos. Um delas, a mais popular, vinha com um flash embutido. Depois de um tempo tinha que se comprar outro flash para substituição. Havia ainda a necessidade de adquirir um filme. Havia de 12, de 24 e de 36 poses. Este filme deveria ser recolhido, enviado a um laboratório para revelação. 
Não era incomum a constatação de que todas as fotos do casamento, por imperícia do fotógrafo ou por imprudência do laboratório, haviam sido perdidas. Muitas vezes os filmes eram enviados pelos Correios para laboratórios localizados na Zona Franca de Manaus (eu disse Manaus!). Depois de quase um mês de espera chegava a encomenda. Algumas fotos aproveitáveis e um filme grátis. Ao lado das fotos algumas miniaturas que, convenhamos, não prestavam para nada.
Hoje não é necessário esforço tão grande. Basta uma máquina razoável, um celular, um Ipad ou mesmo um computador qualquer. É só clicar e pronto. 
Ficou tão comum fotografar que ninguém sai para um passeio sem uma máquina. Às vezes o passeio ou o evento nem é tão grandioso. Porém, é o máximo se render boas fotos. A impressão que me causa é de que toda a emoção vai sendo substituída pelo prazer de  postar a imagem na rede. Os melhores momentos deixaram de existir. Tudo é o melhor momento. O almoço, o restaurante. O café da manhã. O banho no mar. Não há mais tempo  para assistir ao vídeo tape.
A vida de hoje tem edição instantânea.

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