30/04/2013

Cena de sangue


“De noite eu rondo a cidade/a te procurar sem encontrar/no meio de olhares espio em todos os bares/você não está”. Estes versos fazem parte de uma canção das mais conhecidas da Música Popular Brasileira, Ronda. O autor, Paulo Vanzolini, saiu de cena no último dia 28 (28.04.2013). Sua morte, no entanto, passou ao largo, ocupando espaços diminutos nos segundos cadernos dos jornais. 
Ronda é um clássico. Praticamente todos os grandes intérpretes da música nacional uma ou outra vez cantaram as desventuras de uma mulher desprezada pelo amor de sua vida que, pacientemente, se submete a procurá-lo de bar em bar. Injuriada, tomada do sentimento de vingança que acompanha o ciúme, se martiriza antevendo a triste cena de seu amado se refestelando com outras mulheres. 
De certa forma o destaque dado pela mídia corresponde à expectativa de Vanzolini. Apesar do insuspeitável talento como cronista do panorama paulistano, o compositor não via na música uma obrigação. Sua produção era econômica. Talvez por aí se explique a qualidade e o primor que empreendia a cada uma de suas obras.

24/04/2013

O dito e o entendido


A comunicação eficaz é aquela isenta de ruídos. Onde a mensagem enviada pelo emissor é recebida sem distorções pelo receptor. Onde quem fala consegue transmitir uma ideia limpa, sem fantasmas, sem segundas possibilidades de interpretação. Pau é pau e pedra é pedra e ponto final. 
Evidentemente que nem sempre é assim. 
Dia desses atravessando a praça central da cidade, passei por um bando de garotinhas. Possivelmente tivessem entre doze e treze anos.  Duas ou três ostentavam um visual gótico, bem ao estilo anos 90. Cabelos em desalinho, longos na frente- cobrindo os rostos finos e alvos-, curtos atrás, alguns adereços metálicos postos nos lábios e no nariz (piercings), roupas negras. Na parte superior camisas largas, excessivamente folgadas em corpos magérrimos, minúsculos shorts deixando à mostra pernas magras e longas, cobertas por meias pretas. Tênis também pretos, tipo botinha, completavam o escuro visual.

17/04/2013

Futuros possíveis


Entre as meninas a comemoração maior acontece com a chegada dos 15 anos.  Em regra observam-se determinados rituais. Festa ou viagem? Ou as duas? Ou nenhuma das opções, eis que a grana anda curta e há coisas mais sérias para enfrentar como cursinho, faculdade, intercâmbio. Walt Disney, quem sabe?! Noruega, algumas hão de pensar. Entrarão no Google e pesquisarão lugares que nunca sonharam em conhecer, que nunca conhecerão ou, quem sabe, um dia, com mais maturidade, talvez até por lá passem alguma temporada. 
 Entre os jovens, 15 anos nada significam. Já os 18, comemorados efusivamente serão. Carteira de motorista é a primeira providência. Um carrinho seminovo se as finanças dos velhos permitirem. 
A passagem do tempo, especialmente entre os meninos, porém, nem sempre vem acompanhada da responsabilidade. Há muitos que custam a entrar na fase seguinte: a da maturidade. Viverão - como os italianos da atualidade-, por preguiça ou precisão, providencialmente perto dos seus pais. Em caso de algum problema, uma mama ou um papa de plantão de braços abertos encontrarão. Famiglia reunita. 
Eis que passa o tempo e as datas de aniversário vão se tornando comuns. Há certo relaxamento em relação à efeméride. Somente as cheias, 30, 40, 50 e as seguintes vão despertar algum cuidado maior. Por vezes elas chegam carregadas de dramas, de crises próprias da idade.

11/04/2013

Direito ao esquecimento


O ex-presidente João Batista Figueiredo, o último presidente militar da ditadura brasileira, pediu para ser esquecido. Em uma entrevista disse que preferia o cheiro dos seus cavalos ao do povo. Muito embora negue peremptoriamente, Fernando Henrique Cardoso, também ex-presidente, teria pedido aos brasileiros que esquecessem o que ele havia escrito nas décadas anteriores ao seu governo. FHC desmentiu, mas ficou o sentimento de que ele queria realmente que suas teses, publicadas em inúmeras obras, não embasassem julgamentos críticos de seu governo.
Homens públicos vivem na corda bamba. Todo o cuidado é pouco. Uma palavra mal colocada pode gerar um passivo de difícil superação. 
Nos dias atuais a preocupação deveria atingir a todos. As redes virtuais são os meios mais comuns de difusão de pensamento. Ao longo dos tempos, tudo aquilo que está postado, curtido, compartilhado vai construindo um histórico do indivíduo. Meninos e meninas, inexperientes, confiantes no senso de humor, na galhofa momentânea não se dão conta de que o ambiente virtual é traiçoeiro. Não sabem que a rede que os recebe hoje, amanhã vai colocá-los como que diante de um espelho. E o pior, completamente nus. Os comentários fúteis, preconceituosos, a gracinha momentânea, vão, silenciosamente, constituindo um prontuário que, fora do contexto, dará uma ideia da personalidade do indivíduo, o que é chamado no meio virtual de perfil.

04/04/2013

Amor de chocolate


Nunca se amou tanto quanto nos dias de hoje. Nem nos áureos tempos dos romances, quando as moçoilas desconsoladas sofriam a imposição familiar que as afastava de seu grande e idealizado amor. Repito, o amor nunca esteve tão presente quanto na atualidade. Os jovens, então, com seus corações e suas mentes transbordando de emoções e de certezas, determinados pelo bombardeio hormonal que todos, inclusive os mais experientes, um dia estiveram sujeitos. 
Nunca se odiou tanto quanto nos dias de hoje. Os jovens, então, com seus corações e mentes transbordando de emoções e de certeza, determinados pelo dito bombardeio químico hormonal. 
Concentro-me nos jovens, nos adolescentes, eis que esta turma majoritariamente manifesta seus sentimentos com mais facilidade nas redes sociais e além dos meios virtuais. “Amo chocolate”, me diz alguém; “odeio camarão”, me diz outro alguém, que, no entanto, “ama pizza”; “amo tudo isso”, me diz uma propaganda. Ama-se o Grêmio, o Inter, a novela das nove, a Malhação.
Com mesma força e intensidade, “odeio o Inter”, o Grêmio, a novela das nove, a Malhação, o McDonalds, a TV Globo e segue a lista.