Olívia Palito, personagem criado por Elzie Crisler Segar, em 1919 |
As
meninas magrinhas eram chamadas de Olívia Palito. As muito altas
eram garças, girafas, coqueiro ou outra coisa que o valha. Os
meninos com óculos eram invariavelmente denominados de Quatro Olhos.
Se os óculos compensavam muitos graus de deficiência era comum
serem chamados de fundo de garrafa. Os gordinhos eram Baleia Fora
D´água. Os baixinhos eram anões de jardim, tampinha e outras
denominações de estilo.
E tudo
isso era muito normal, naquela época. Normal entre aspas. É claro
que para quem não fazia parte do grupo da magreza, dos míopes e dos
que lutavam contra a balança, a situação era uma. As olívias, as
garças, girafas ou coqueiros, os quatro olhos, os tampinhas e os
baleias não achavam tanta graça assim no tratamento jocoso. Não
era mau humor não. Ocorre que sentiam na pele a dor de ser apontado
por alguma característica sobre a qual não tinham qualquer
possibilidade de mudança. Sofriam porque contrariavam o padrão
estabelecido pelos outros de forma autoritária e despida de qualquer
possibilidade de defesa.
O pior
é que quem se rebelava, quem xingava, quem esbravejava, quem se
insurgia contra o injusto tratamento acabava contribuindo para que o
apelido cristalizasse. Era uma vingança velada: “se fulano se
incomoda, aí é que vamos incomodá-lo!”. Eis que, “bom cabrito
não berra!', diziam as sábias mentes.
Não se
falava, é verdade, em bullying. A meninada era mais chucra. Tudo era
mais direto e, portanto, mais cruel. Não havia sutileza no ar. Até
mesmo os padrões de beleza eram outros. E o mediano era a regra.
O que
hoje é a tônica nas passarelas de moda, naqueles tempos era motivo
de desprezo. Mulheres magras não tinham vez. As mães e as avós
queriam filhas coradas e, de preferência, com alguma protuberância
física. Isto significava saúde. Se a menina fosse magra, alta, de
pernas longas, então, o castigo vinha em dobro: além do tratamento
desairoso dos colegas de aula e mesmo de familiares, ainda tinham que
ouvir a conversa da avó e das tias de que precisavam comer muito
pois pareciam doentes.
O tempo
passa e as coisas mudam. Mudam os padrões. Mudam as convicções.
Se ontem quase todos desprezavam aquele formato, hoje os estilistas
procuram com binóculos nos corredores refrigerados dos shoppings
muita magreza e altura. Porém, não vamos imaginar que o problema
está resolvido. Não!
As
pessoas que não preenchem o padrão das passarelas, das revistas de
modas e do mundo televisivo são vistas com olhos que condenam. Dia
desses uma dessas celebridades televisivas apareceu na praia de
biquíni. Bastou para que seu corpo fosse esquadrinhado e analisado
milimetricamente. Chegou-se ao consenso de que estava fora de forma e
isso se tornou matéria jornalística. E os boquiabertos internautas
desprovidos de massa encefálica gastaram seu verbo compartilhando
comentários ácidos e preconceituosos nas redes sociais sobre a
forma da moçoila. Depois se soube que ela ostentava uma barriguinha
de grávida e estava muito feliz com isso.
Ou
seja, muda o tempo, mas não mudam os instintos. Muda o tempo, mas os
medíocres continuam repetindo o que se fez no passado. Hoje, a
situação piorou um tanto. Com o fenômeno das redes sociais a
idiotia ganha o mundo.
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