“De noite eu rondo a cidade/a te procurar sem encontrar/no meio de olhares espio em todos os bares/você não está”. Estes versos fazem parte de uma canção das mais conhecidas da Música Popular Brasileira, Ronda. O autor, Paulo Vanzolini, saiu de cena no último dia 28 (28.04.2013). Sua morte, no entanto, passou ao largo, ocupando espaços diminutos nos segundos cadernos dos jornais.
Ronda é um clássico. Praticamente todos os grandes intérpretes da música nacional uma ou outra vez cantaram as desventuras de uma mulher desprezada pelo amor de sua vida que, pacientemente, se submete a procurá-lo de bar em bar. Injuriada, tomada do sentimento de vingança que acompanha o ciúme, se martiriza antevendo a triste cena de seu amado se refestelando com outras mulheres.
De certa forma o destaque dado pela mídia corresponde à expectativa de Vanzolini. Apesar do insuspeitável talento como cronista do panorama paulistano, o compositor não via na música uma obrigação. Sua produção era econômica. Talvez por aí se explique a qualidade e o primor que empreendia a cada uma de suas obras.
Na realidade o compositor paulista se confessava um completo ignorante em termos musicais. Dizia que a música era um hobby, lembrando que não sabia cantar e nem sabia diferenciar entre o tom maior e o menor. Sua paixão era a zoologia a quem dedicava cerca de 15 horas do seu dia. Neste ramo investiu todos os seus esforços. Era Doutor pela Universidade de Harvard, nos EUA. Teve reconhecimento pelas ações realizadas como cientista sendo agraciado com prêmios e condecorações.
A música era apenas uma diversão. Nada mais que isso. Especializado em répteis, aproveitava as poucas horas vagas que tinha para lapidar com apurado cuidado as letras de suas músicas. Exigente, às vezes trabalhava na finalização de uma composição por até um ano. Como não tocava nenhum instrumento, contava com o apoio de amigos músicos para quem entoava suas canções.
O sucesso verdadeiramente não lhe fazia a cabeça. Tanto que desprezava a sua canção mais conhecida, Ronda. Dizia que não gostava da música. Ia além, ironizando quando alguém lhe dizia que a música era uma espécie de hino da cidade de São Paulo. “Que belo hino”, dizia, lembrando que a composição é piegas, se ocupando do amor de uma prostituta por um amante cheio de vícios.
Apesar do desprezo do autor, os versos finais de Ronda são marcantes. Têm o condão de transportar o ouvinte até o local dos acontecimentos que, vez por outra, estão na capa dos nossos periódicos. Não são poucas as “cenas de sangue num bar da Avenida São João”.
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