07/08/2017

Os Leões

A história seria diferente se quem a contasse fossem os leões e não os caçadores de leões, diz um sábio ditado africano. Se os escravos africanos, capturados em suas tribos e levados à força mundo afora para construir riquezas, fossem os historiadores de seu tempo, certamente os livros seriam romances recheados de cenas de terror, de dor e de medo, tal a agressividade reinante nesta relação entre os colonizadores e os bichos-homens da África. Os negros africanos, segundo religiosos europeus e boa parte da elite pensante, eram animais brutos. Não tinham alma. Assim, a escravidão era uma benção, pois colocava a fera em contato com a cultura de homens civilizados, sábios, conhecedores da vida, da justiça e tementes a Deus.
Mesmo nos tempos atuais, quando sondas ultra-avançadas vasculham o universo em busca de planetas que possam abrigar a vida humana, prevendo de algum modo que a humanidade conseguirá esgotar todos os recursos da Terra, algum ranço histórico vem passando de pai para filho quando se fala de história. Os colonizadores europeus sabe-se se inscrevem como salvadores da pátria. É verdade que desbravaram os oceanos atrás de terra e riquezas aumentando o tamanho do mundo.  
Porém, como tudo na vida tem mais de um enfoque, não podemos desconhecer que estas descobertas trouxeram uma série de transformações, algumas delas nefastas, como o extermínio da população indígena e a escravidão dos africanos para servir de mão de obra barata.
Recentemente, pesquisadores do Centro de Pesquisas Sociais de Coimbra, Portugal, analisaram com profundidade os principais livros de história daquele país, notadamente no capítulo sobre escravidão. A conclusão que chegaram é que, ainda hoje, perdura naquele país a visão romântica do colonizador. A visão que os jovens têm é a de que a escravidão e rim processo amigável. Os textos históricos portugueses levam a crer que os negros escravizados eram convidados a emigrar para outro continente. Nenhuma palavra sobre perseguições, sobre correntes e uso de força.
A pesquisa coordenada pela portuguesa Marta Araújo destaca, ainda, que os historiadores de sua terra são condescendentes com os colonizadores pátrios, mas criticam a violência dos espanhóis, franceses, britânicos e belgas. 
Por falar nisso, alguma curiosidade me ocorre ao lembrar que este período que atravessa nosso país será tema de pesquisas e, posteriormente, será tratado nas aulas de história para uma geração que nem nasceu ainda. Nomes como Michel Temer, Aécio Neves, e Eduardo Cunha estarão gravados ali. Ministros do STF, juízes e promotores também vão aparecer. E Lula não faltará, com certeza. Creio que nem o melhor dos adivinhos consiga prever quais as tintas comporão este histórico quadro.
Uma coisa é certa: não será fácil entender este enrosco que envolve cumplicidades, traições, interesses, fraudes, delações, diz-que-me-diz, enriquecimentos ilícitos e  todo o tipo de situações. O historiador terá que ser um leão para encarar a luta.

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