28/04/2010

A estética do frio

O frio era intenso naquele tempo. Era maior, muito maior do que o de hoje. Talvez a temperatura fosse a mesma deste julho*. Porém, o frio que sentíamos era sem comparação. Gente simples, pobre, sofre com temperatura baixa. Com reforçadas botas, capote, poncho, luvas e outros apetrechos do estilo, não há porque se respeitar o termômetro.
Naquela época, porém, inverno era sinônimo de tristeza. Também pudera ao invés de botas reforçadas as simples e invariáveis havaianas. Elas duravam bem mais do que o ano. Quando os sinais do uso se faziam presentes, as tiras rebentavam e um providencial prego alongava a vida útil por mais alguns dias, talvez semanas. Os outros itens indispensáveis, que hoje adornam nossos roupeiros eram meros sonhos, acalentados embaixo de cobertas feitas de retalhos. Frio com chuva, então, era uma desgraça. Motivo de recolhimento, de faltar à aula, de matar a pelada de fim de tarde. Sem chuva, arriscávamos uma contenda de pés descalços, de calções curtos e puídos.

25/04/2010

Quem são nossos amigos?

A amizade é um dos sentimentos mais belos que existe. Não sabemos ao certo quando ela vai nascer, nem temos o poder de determinar quais as pessoas que serão nossas amigas. Não escolhemos os amigos. Eles aparecem, vão se infiltrando na nossa vida, vão se investindo de importância e, quando menos esperamos, se tornam indispensáveis.
A amizade possui, porém, algumas peculiaridades. A verdadeira é pura, desprovida de qualquer interesse. O amigo é amigo e pronto. Independe da situação, na alegria ou na tristeza, na bonança ou na tempestade, o amigo é o porto seguro, incapaz de negar apoio. Não, o amigo não aprova tudo o que fizermos. Ele pode e deve - se for amigo mesmo-, abrir nossos olhos quando investimos pelos caminhos menos indicados.
A palavra amigo nasce da raiz latina que originou o vocábulo amor. Assim, amigo é alguém que gostamos muito, que amamos. Respeito, sinceridade, confiança e cumplicidade são apenas alguns dos atributos indispensáveis em uma relação de amizade. Sem qualquer um deles e não haverá amizade.

Os erros de cada um

Conheci um indivíduo que, tão logo alguém destacasse um defeito de alguém, ele, de maneira sutil, destacava uma virtude. No início, sua preocupação em neutralizar os comentários negativos me pareceu estranho, muito estranho! Só depois de algum tempo notei que esta é a melhor maneira de esvaziar uma conversa que vai enveredar, inevitavelmente, pelo caminho da apreciação, em regra negativa, apressada, sobre a personalidade, o caráter ou qualquer coisa que se relacione ao outro.
Nos tempos atuais nos acostumamos com o rigor excessivo em relação ao outro. Julga-se apressadamente, condena-se, inevitavelmente. Apontam-se as falhas dos outros, às vezes sem piedade. Talvez seja um viés dos tempos atuais. Nunca houve tanto rigor, tanta cobrança. Nunca houve, por consequência, tanta intolerância. É por isso que os relacionamentos não duram. Famílias se desfazem. As amizades são frias, as pessoas não mais se visitam e acabam por perder o contato.

23/04/2010

Pequeno exercício cerebral

Nosso cérebro é mesmo algo fabuloso. É o nosso poderoso arquivo. Está fechado hermeticamente dentro de nosso crânio. Classifica e guarda em compartimentos bem definidos desde as funções mais básicas, como respirar, caminhar e mastigar, até coisas mais complexas como guardar todas as senhas que fazem parte da nossa vida. Banco, cartão de crédito, internet, conta de e-mail, Facebook etc. Ou, ainda, para alguns, definir o ponto exato de cozimento do miojo.
Ao longo do tempo, o grande desafio foi sempre exercitá-lo para retirar daí algo novo, ampliando o conhecimento existente. A representação das coisas pelos números foi um dos primeiros progressos. O aparecimento da escrita, obra de algum cérebro realmente pensante foi outro. Claro que as coisas não aconteceram assim, do dia para a noite. Primeiro o escambo, a troca. Depois a indexação de produtos a um só fator. Até que alguém teve a ideia de unir tudo isso. Juntando todos os fatores, depois de muito exercício cerebral, surge a moeda. É um processo de construção, lento e gradual. Tanto que as primeiras manifestações escritas, na realidade, versavam sobre bisões, servos e pequenos homens com suas lanças. Narravam as aventuras e desventuras de homens enfrentando os desafios da natureza.

22/04/2010

A força dos dizimados


Índios botocudos- Minas Gerais


Quando Pedro Alvarez Cabral por aqui chegou, em 1500, aproximadamente seis milhões de silvícolas encontravam-se espalhados por esta imensa extensão de terra. Eram mais de 1700 povos, com culturas e línguas distintas. Reza a tradição que os povos foram chamados de índios, pois os navegadores acreditavam estar chegando à Índia que seria o destino traçado. Na verdade, indian era a designação genérica dada pelos europeus a todos aqueles que moravam em locais muito distantes do centro da civilização.
Os índios sentiram na pele a força opressora dos colonizadores que impuseram crenças, escravizaram tribos inteiras, espalharam suas doenças, terminado por dizimar boa parte do povo. Os franceses, mais cordiais, foram os que melhor se integraram com os índios. Os portugueses, no entanto, por serem em maior número ocupavam as terras com violência, saqueando e aprisionando homens, crianças e mulheres.

21/04/2010

O Novo Tempo


João Batista, Luís Henrique, Vanderlei, Sílvio Benfica, Sérgio Rolim e Solano Reis (foto: Mário Gubert)

O início dos anos 80 foi movimentado. Em Osório também. Redemocratização, eleições diretas, fim das áreas de segurança, greves, surgimento de novas lideranças, inconformidade, abertura política e a volta de exilados eram alguns temas que estavam em voga. Os novos ares eram anunciados pelo movimento new wave, que se iniciou no final dos anos 70 nos EUA e Europa, chegando até aqui através da estética que valorizava as roupas excessivamente coloridas, ombreiras, cabelos ao estilo punk, mas bem alinhados e certo ar de deboche juvenil.
O pop rock nacional foi o que traduziu com mais propriedade este novo jeito de ver o mundo. Titãs, Kid Abelha, Blitz, Rádio Taxi, Paralamas do Sucesso, RPM, Plebe Rude transitaram pelos palcos de todo o Brasil juntando um pouco de tudo. Punk, Diretas-Já, diversão pura carioca, praia, Brasília, São Paulo, injustiças sociais, enfim, um caldeirão de ideias e ânimos revitalizando um rock nacional decadente.

O politicamente correto

Mussum
Foi nos anos 80, do século passado, que os americanos introduziram a noção de politicamente correto. A iniciativa visava, antes de tudo, jogar uma luz sobre os conceitos, sobre os vocábulos, tornando mais respeitosas as relações. Assim, palavras como negro, escuro e preto foram sumindo, tendo em vista a conotação racista que poderiam esconder. O indivíduo negro passou a se denominar afro-descendente.
No Brasil, nos idos dos anos 90, a mania chegou com força. A partir daí, a conversa livre e solta sofreu um baque. A cautela, tão desprezada na linguagem diária, tomou corpo. Certa censura implícita foi tomando conta de tal forma que falar livremente, usando-se as expressões que se usavam num passado não muito distante ficou inviável. Uma das primeiras vítimas foi o Didi, o humorista Renato Aragão, que chamava o Mussum de Negão. “Preto é o teu passadis”, respondia o simpático afro-descendente. O humor, notadamente construído a partir das diferenças pessoais, sofreu um aperto danado, pois as grandes piadas estão relacionadas justamente com a origem e a forma das pessoas.

Cisco Xavier


O médium Francisco Cândido Xavier, conhecido mundialmente como Chico Xavier, vem sendo lembrado com insistência nos últimos dias, com matérias na televisão, nos jornais e, inclusive com o lançamento nacional de um filme sobre sua vida. Lembrança mais do que justa, pois o médium mineiro completaria no dia 02 de abril, 100 anos. São inegáveis os méritos de Chico, que dedicou toda a sua vida à assistência aos menos favorecidos.
É comovente seu trabalho de consolação aos familiares, com a psicografia de mensagens de entes queridos que partiram desta dimensão. Relevante, ainda, o desprendimento material de Chico Xavier, que doou os direitos autorais de todas as suas obras, 451 livros psicografados, a entidades voltas à assistência social. Segundo seus amigos e colaboradores mais diretos, Chico sempre doou tudo o que tinha às pessoas necessitadas.
O médium mineiro foi e é fundamental na divulgação da Doutrina Espírita. Vem sendo traduzido no mundo todo. A lembrança de sua vida, sua obra, de sua dedicação pela caridade, de sua determinação pelo bem é muito positiva, especialmente nestes tempos de extremo materialismo, onde o valor mais cultuado tem sido o eu.