25/06/2015

Perguntas e respostas

Quanto mais o homem aprofunda sua pesquisa sobre a existência, mais perguntas surgem. O universo, visto no passado como a única fronteira possível, já não contém tudo o que existe. O olhar já está ultrapassando suas paredes. O cientistas estão loucos para explorar os mistérios que se escondem depois da luz. Há milhões de teorias, teses e ideias (no mais das vezes sem comprovações) sobre a vida e a morte dos homens, dos planetas e dos sistemas. As viagens vão se tornando maiores e, com isso, as perguntas, contrariando o que se imaginava, ao invés de receberem respostas concretas e acabadas vão se tornando mais complexas e inalcançáveis.
Alguém que esteja lendo isto tudo pode estar pensando: que se quer abordando estas coisas assim tão distantes? Para que esforço mental tamanho se há coisinhas menores e mais preocupantes nestes tempos de crise econômica e moral?
Com razão lembrará que existem questões muito mais prementes a serem tratadas nas páginas de um jornal como, por exemplo, os casos de corrupção que envolvem numa mesma lama esquerdistas, centristas e direitistas. Todos com um único pensamento: garantir o poder, o conforto seu e das gerações que os seguirão.
Há outros assuntos tão palpitantes, é verdade. A qualidade dos alimentos que levamos à boca. O sofrimento dos animais que servem de alimento, de cobaia de laboratório para desenvolvimento de medicamentos etc etc etc. As manipulações genéticas que transformam singelos vegetais em bombas de efeitos incalculáveis, desconhecidos e convenientemente esquecidos pela mídia, regiamente financiada pela indústria alimentícia. Enfim, não precisamos de tanto esforço assim para elencar três ou quatro questões importantes, sem solução e altamente preocupantes. Isto que nem tocamos na questão dos recursos naturais que antes pareciam inesgotáveis, mas hoje se revelam passíveis de esgotamento.  
Talvez a espécie humana não viva tanto para encontrar todas as respostas. Há quem aposte que o homem, como os animais que vão se tornando raros e depois desaparecem, é mais um que entrará, mais dia menos dia, num processo de extinção. Ou seja, há teorias que dizem que o homem não é o suprassumo do universo. Não é,como se diz vulgarmente, a última bolachinha do pacote. É, isto sim, mais um entre tantas espécies de vida que existem por aí. Muitas delas invisíveis aos olhos humanos.
 Mas, e o universo? E as questões transcendentais? E futuro da espécie? E as dimensões paralelas?  E o multiverso? Conseguirá o homem encontrar respostas plausíveis para as intrincadas questões? Ou permanecerão mistérios insondáveis para todo o sempre?
Veremos. Ou não!


O queijo

Contam por aqui que nos idos dos anos 70, um espertalhão conhecido na paróquia saia pela região vacinando os cães contra a raiva. Quando ele chegava era um verdadeiro alvoroço. Todos queriam receber as doses milagrosas que garantiam a saúde de seus amados bichos. Os meninos eram convocados a correr atrás dos totós para trazê-los à presença do dito sujeito. 
Porém, ao que consta o esforço dos meninos era em vão. Gastavam energia correndo atrás dos bichinhos mais ariscos. Alguns se embrenhavam nas matas. Outros entravam para debaixo das casas de madeira. Assustados com o movimento não queriam a proximidade de ninguém. Sorte dos que fugiam das picadas das agulhas do indivíduo. Os bichinhos não eram imunizados. Afinal de contas, água e sabão servem para lavar as mãos, a roupa. Não salvam os cães da raiva.   
Nem sei se a história é verdadeira ou faz parte do folclore regional. Uma coisa sei: o que fazia o estelionatário naqueles tempos, diante do repertório inesgotável de falcatruas, pode  hoje ser considerada uma  brincadeira infantil. Nestes pagos, que em princípio parece ser habitado tão somente por seres trabalhadores, honestos e exemplos para “o resto” do país, tem aparecido cada coisinha capaz de deixar o mais desavergonhado dos seres com cabelos em pé ou com o rosto vermelho de vergonha.
Há alguns anos, descobriu-se que a bebida típica do Rio Grande, a venerada erva-mate que chegava embalada nos supermercados, recebia doses de um sem número de folhas de outras árvores não tão nobres, mas abundantes. A erva batizada foi um escândalo. Os ervateiros se defenderam. Tocaram rótulos. Criaram outras empresas, outras marcas e tudo caiu no esquecimento.
Agora, faz pouco, descobriu-se que o leite nosso de cada dia sai da teta da vaca de um jeito e chega na xícara do vivente de outro. No meio do caminho vai recebendo aditivos: água, cal, formol e mais um monte de porcarias. Escândalo, prisões, multas etc etc etc. Aparentemente o caso foi superado. Aparentemente, eu disse! Na verdade, não há como evitar: sempre que vejo o tal do leite me dá a impressão de que aquele produto ali foi batizado. 
Gosto muito de queijo. Com goiabada, então, fica uma delícia. Pois não é que agora aparece esta falcatrua no processamento do queijo aqui na Colônia de São Pedro. O leite desprezado pela indústria virava queijo lá nas missões. Com gosto de gasolina. Vejam só: gasolina. Pode uma coisa dessas? Claro que pode. E pode muito mais: ainda faltam a nata, o iogurte, os lactobacilos, o requeijão e um monte de outros produtos que, em tese, saem do leite.
Ao levar algo à boca nem é bom pensar muito. A menos que consigamos produzir tudo o quanto precisamos para viver. O que, convenhamos, é quase impossível. Pensar às vezes dói, às vezes gera stress e ansiedade. As falcatruas estão no ar. Às vezes vêm dos locais mais improváveis. Às vezes não: vêm de onde esperamos.

10/06/2015

Realidades Paralelas

O guru diz que haverá um dia em que os mistérios serão todos revelados. Não fala claramente, assim com todas as palavras. Não é impositivo. Apenas sugere com delicadeza, com parcimônia. De modo cifrado, joga aos ouvintes pequenas notas que vão se juntando sem pressa. Sua voz é mansa. Não atropela as palavras que saem lentamente de sua boca. Cada um dos ouvintes, no entanto, vai montando o quebra-cabeças ao seu modo. E, a partir, criam-se realidades distintas.
Alguém ouve a mensagem e acredita que o guru diz claramente que finalmente um dia seu talento será reconhecido no trabalho. E aquele cargo que hoje é ocupado por seu desafeto será seu. Somente seu. E o salário, bem maior que o seu, fará uma diferença no final do mês. E a felicidade, então, se fará presente. E os dias do passado, tão tristes ficarão onde devem: no passado.

04/06/2015

Feijão e Arroz


Faz frio. Leonel caminha pela cidade. O vento é cortante. Passa pela sua jaqueta, pouco caso faz da camiseta. Sente súbita fraqueza. Também, já são 12 horas. Acordou cedo. Tomou um café ralo. Café com leite, um pedaço pequeno de mamão, um biscoito. E começou com as tarefas do dia.
Havia chovido. O apartamento tinha cheiro de queimado misturando-se com a umidade do dia inteiro de chuva. Borrifou para o alto uma essência de cravo e canela. Alguns minutos depois, o ranço venceu. Estava ainda de meias e pijama. “Disciplina é liberdade; compaixão é fortaleza, ter bondade é ter coragem”, cantava Renato Russo no pequeno som na sala, espalhando sua dor, suas dúvidas, sofrimentos e paixões. Achou que a vizinha, uma senhora simpática, mas com certo ar triste, talvez não precisasse ouvir a música que escolheu. Reduziu o volume.