Contam por aqui que nos idos dos anos 70, um espertalhão conhecido na paróquia saia pela região vacinando os cães contra a raiva. Quando ele chegava era um verdadeiro alvoroço. Todos queriam receber as doses milagrosas que garantiam a saúde de seus amados bichos. Os meninos eram convocados a correr atrás dos totós para trazê-los à presença do dito sujeito.
Porém, ao que consta o esforço dos meninos era em vão. Gastavam energia correndo atrás dos bichinhos mais ariscos. Alguns se embrenhavam nas matas. Outros entravam para debaixo das casas de madeira. Assustados com o movimento não queriam a proximidade de ninguém. Sorte dos que fugiam das picadas das agulhas do indivíduo. Os bichinhos não eram imunizados. Afinal de contas, água e sabão servem para lavar as mãos, a roupa. Não salvam os cães da raiva.
Nem sei se a história é verdadeira ou faz parte do folclore regional. Uma coisa sei: o que fazia o estelionatário naqueles tempos, diante do repertório inesgotável de falcatruas, pode hoje ser considerada uma brincadeira infantil. Nestes pagos, que em princípio parece ser habitado tão somente por seres trabalhadores, honestos e exemplos para “o resto” do país, tem aparecido cada coisinha capaz de deixar o mais desavergonhado dos seres com cabelos em pé ou com o rosto vermelho de vergonha.
Há alguns anos, descobriu-se que a bebida típica do Rio Grande, a venerada erva-mate que chegava embalada nos supermercados, recebia doses de um sem número de folhas de outras árvores não tão nobres, mas abundantes. A erva batizada foi um escândalo. Os ervateiros se defenderam. Tocaram rótulos. Criaram outras empresas, outras marcas e tudo caiu no esquecimento.
Agora, faz pouco, descobriu-se que o leite nosso de cada dia sai da teta da vaca de um jeito e chega na xícara do vivente de outro. No meio do caminho vai recebendo aditivos: água, cal, formol e mais um monte de porcarias. Escândalo, prisões, multas etc etc etc. Aparentemente o caso foi superado. Aparentemente, eu disse! Na verdade, não há como evitar: sempre que vejo o tal do leite me dá a impressão de que aquele produto ali foi batizado.
Gosto muito de queijo. Com goiabada, então, fica uma delícia. Pois não é que agora aparece esta falcatrua no processamento do queijo aqui na Colônia de São Pedro. O leite desprezado pela indústria virava queijo lá nas missões. Com gosto de gasolina. Vejam só: gasolina. Pode uma coisa dessas? Claro que pode. E pode muito mais: ainda faltam a nata, o iogurte, os lactobacilos, o requeijão e um monte de outros produtos que, em tese, saem do leite.
Ao levar algo à boca nem é bom pensar muito. A menos que consigamos produzir tudo o quanto precisamos para viver. O que, convenhamos, é quase impossível. Pensar às vezes dói, às vezes gera stress e ansiedade. As falcatruas estão no ar. Às vezes vêm dos locais mais improváveis. Às vezes não: vêm de onde esperamos.
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