Não sei ao certo de onde vem esta estratégia atual do mundo da propaganda e do marketing de utilizar trilhas sonoras consideradas por muitos como prá lá de brega. O Bombril, lá em 2007, apresentava o Nélson Ned cantando “que tudo passa, tudo passará”, um sucesso do início dos anos 70. Bem recentemente, em publicidade da Bradesco Seguros, o cantor Byafra apareceu com seu Sonho de Ícaro espantando um ladrão de carro.
Os publicitários não têm sossego. Correm sempre contra o tempo na busca da imagem perfeita, do texto e da canção que embalará os intervalos comerciais dos ávidos consumidores. Agora mesmo, direto do túnel do tempo, como diria aquela apresentadora, o velho Evaldo Braga ganhou vida novamente. Enquanto homens choram ao ver o lançamento da Renault passar, uma versão roqueira embala o choro dos rapazes com a inconfundível música: “Sorria, meu bem/ sorria/ da infelicidade que você procurou”.
Evaldo Braga, um mero desconhecido das gerações mais novas, foi uma artista de renome naqueles tempos em que boa parte da produção musical visava aplacar as dores de amores. Lá no final dos anos 60 e início dos 70, as músicas populares –destinadas aos ouvidos menos exigentes- eram verdadeiros tratados de sofrimento, histórias tristes de gente desprezada, abandonada pela sorte. Apelidadas de dor de cotovelo, de fossa, soavam como tortura às mentes mais exigentes, estas perfeitamente engajadas nas denúncias políticas contra a ditadura militar.
Esnobado pela intelectualidade da época, que tinha outros favoritos como Chico Buarque, Elis, Milton, Caetano, João Gilberto, Gil. Esnobado também pela gente da segunda linha, que tinha Roberto e Erasmo e a turma da Jovem Guarda, Evaldo Braga foi um rei no meio do povão. Sua turma era aquela gente que cantava as agruras dos pobres, com perfeito conhecimento de causa.
É bem possível que o compositor de Sorria, Sorria, ao cantar com sua possante voz verdadeiramente não estivesse interpretando, mas sim transmitindo sua verdadeira dor e seu íntimo sofrimento. Pelo que sabe Evaldo Braga sempre conviveu com infortúnios. Consta em sua biografia que tão logo nasceu foi jogado pela sua mãe, uma prostituta na cidade de Campos, no RJ, numa lata de lixo. Foi forte o suficiente para sobreviver. Sem pais conhecidos, foi enviado para um internato onde teria crescido ao lado de outro ídolo, Dadá Maravilha. Como não havia sido adotado foi acolhido nas instalações da FUNABEM, órgão que assistia meninos infratores e órfãos.
De vida sofrida, encontrou na caixa de engraxar sapatos a grande oportunidade de sua vida. Talvez embalado por algum sonho, colocava-se estrategicamente na porta das gravadoras. Ali conheceu muita gente de peso. Certo dia conseguiu que uma música sua fosse gravada (Areia no meu caminho) e fez tanto sucesso que as portas do mundo do espetáculo foram se abrindo. Alguns intérpretes de então, como Paulo Sérgio, adotaram-no como letrista e o sucesso se fez constante. Com o tempo virou figurinha carimbada nos programas do Chacrinha.
A vida de sofrimento do Ídolo Negro, como era conhecido no auge da carreira, não seria completa se não terminasse de maneira abrupta. E tal qual nos roteiros mais previsíveis dos filmes de Hollywood, um acidente de trânsito terminou com a carreira do jovem Evaldo Braga, no frescor dos seus 25 anos. Mesmo que a canção Sorria, Sorria não tenha a qualidade que nossos ouvidos exigem, não há como negar que a sua sobrevivência ao menos serve para que venhamos a conhecer um pouquinho da história deste brasileiro que soube lutar por um ideal. No caso dele, sobreviver. “Chorar pra que? Chorar! Você deve sorrir /Que outro dia será bem melhor”.
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