Nossos olhos captam o movimento
do mundo à nossa volta. E não estamos sós. Os olhos dos outros captam nossos
movimentos. E assim, trocando olhares, vamos seguindo nosso caminho por aqui.
Olhamos e somos olhados. E nossa imagem vai sendo medida. Nossos passos vão
sendo analisados, sem maldade, sem interesse. Ou com maldade e com interesse.
Até
que ponto o olhar do outro interfere no nosso dia a dia, no nosso modo de
viver? Há quem diga que não se preocupa com o que os olhos dos outros captam.
Será verdade?
Quando cursava Letras, na FACOS, participei de
um curso de teatro. Os anos 80 estavam
no seu auge. Desejava aprender algo mais, algo novo. Queria algo que
efetivamente contribuísse de algum modo
para construir um novo olhar sobre a realidade. E a realidade artística,
convenhamos, é sedutora.
Certo
é que não me tornei um ator de teatro. De lá para cá não figurei em qualquer
peça, nem como mero figurante. Porém, um exercício dos mais comuns foi muito
significativo. O mestre formou uma espécie de corredor polonês. A tarefa era
extremamente simples. Cada um dos pretensos futuros atores deveriam tão somente
caminhar naturalmente enquanto trinta pares de olhos acompanhavam seus passos.
O circuito não era maior do que uma dezena de metros. Portanto, não passavam de
dez passos.
O
percurso todo era superado em um minuto, se muito. O tempo, porém, parecia
conspirar contra cada um dos alunos. Alguns simplesmente travavam no começo da
jornada. Não faltavam vozes de incentivo. Porém, quanto maior o apoio maior era
a dificuldade. As pernas ficavam pesadas. O corpo não respondia direito. Os
gestos saiam caricatos.
A
conclusão óbvia é de que tudo muda quando os olhos dos outros estão te mirando.
Em regra, as pernas deixam a naturalidade de lado. Isto, claro, quando o
indivíduo está efetivamente preocupado com a imagem que o olhar do outro está
captando. A necessidade de caminhar melhor, com maior graça, com maior leveza
vai sepultando o passo natural, corriqueiro e verdadeiro. E o passo
desengonçado, claudicante, trôpego não consegue ser refeito. Só o passo
seguinte pode concertá-lo.
“Este
passo não é natural. Não é teu. Isto não é crível”, dizia o mestre após cada um
concluir o percurso. Repetimos a lição um par de vezes. Saí dali com a nítida
impressão de que as técnicas do teatro são bem úteis para estes artistas
amadores que somos todos nós.
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