"Neste novo contexto, os certos e os errados vão sendo amenizados.
Nas boas conversas não mais são admitidas teses onde a certeza
reside na bipolaridade."
Tinha mais certezas do que idade. Era adolescente, mas carregava uma
carga imensurável de certos e de errados. Dúvidas eram poucas. Pelo
menos era o que acreditava. O tempo, no entanto, vai passando e com
ele as coisas vão se modificando aos poucos. A vida avança, as
experiências vão chegando, as opções sendo feitas, os caminhos
construídos e as certezas vão sendo desfeitas. Um engano aqui outro
erro lá, uns acertos neste setor e outros no lado de lá. Com o
andar da carroça misturam-se os certos e os errados de tal forma que
pode chegar uma hora em que o embaralhamento transfigure tudo.
Bem se sabe hoje que a Teoria da Relatividade, descoberta pelo físico
alemão Albert Einstein, considerada a grande mente do século XX,
incide não só na Física. Deixando a complexidade de lado,
resumidamente pode se dizer que a Teoria da Relatividade afirma que o
tempo não é igual para
todos,
podendo variar de acordo com a velocidade, a gravidade e o espaço.
A relatividade saiu das garras da Física e se influenciou outros
ramos de conhecimento. Não há, por exemplo, como se conceber hoje
um pensamento que não preveja certo grau de variação, de concessão
e de alternatividade justamente pela “relatividade das coisas”.
Neste novo contexto, os certos e os errados vão sendo amenizados.
Nas boas conversas não mais são admitidas teses onde a certeza
reside na bipolaridade. Céu ou inferno, paraíso ou tártaro,
espírito ou matéria, bondade ou maldade, branco ou preto. Como tudo
é relativo, entende-se comumente que a pobreza esconde-se na
existência de duas únicas possibilidades para a solução de alguma
questão. Ou seja, é mais racional e inteligente admitir que entre o
céu e o inferno existam muitas outras possibilidades. Muitas delas
não entendidas, não admitidas e nem mesmo percebidas pelos
indivíduos que, por natureza, preferem a certeza da bipolaridade ou
mesmo temem não controlar o vasto conteúdo que se abre e que pode
gerar insegurança e incerteza.
Os velhos pensadores bem que preferem as dívidas. Dizem que não
fossem as dúvidas a Terra ainda seria o centro do universo e
perduraria até hoje a impossibilidade de se navegar pelos vastos
oceanos, eis que monstros marinhos engoliriam as embarcações dando
fim à valentia dos navegantes.
A ciência tem como mote a incerteza. Certo grau de desconfiança é
necessária para que os pesquisadores busquem respostas. Então, as
perguntas tornam-se mais interessantes do que as próprias respostas.
Pode mesmo a incerteza, a dúvida, se tornar o combustível de uma
boa pesquisa. E perguntar é uma arte. É arte de construção. Que o
digam os filósofos, esses cientistas da indagação e da construção
da sabedoria.
A própria religiosidade, quando abandona a bipolaridade e se permite
transitar no ramo das possibilidades ganha com esta relatividade. O
que mais fazem os doutrinadores é apresentar certezas e soluções
prontas. Incentivam o medo fermentando o inimigo. Embaralham ideias
complexas para torná-las simples com o intuito de ganhar a alma do
crente. Dão o paraíso como certeza. Não restam dúvidas. Não há
relatividade. Não há possibilidades outras que não estão estejam
previstas, que não estejam impressas, que já não tenham sido
ditas. O mundo, aparentemente, parou. Nada mais há de novo no front.
Ou seja, já está tudo decidido porque assim se quis.
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