05/12/2018

As certezas. As dúvidas. A relatividade

 "Neste novo contexto, os certos e os errados vão sendo amenizados. Nas boas conversas não mais são admitidas teses onde a certeza reside na bipolaridade."


Tinha mais certezas do que idade. Era adolescente, mas carregava uma carga imensurável de certos e de errados. Dúvidas eram poucas. Pelo menos era o que acreditava. O tempo, no entanto, vai passando e com ele as coisas vão se modificando aos poucos. A vida avança, as experiências vão chegando, as opções sendo feitas, os caminhos construídos e as certezas vão sendo desfeitas. Um engano aqui outro erro lá, uns acertos neste setor e outros no lado de lá. Com o andar da carroça misturam-se os certos e os errados de tal forma que pode chegar uma hora em que o embaralhamento transfigure tudo.
Bem se sabe hoje que a Teoria da Relatividade, descoberta pelo físico alemão Albert Einstein, considerada a grande mente do século XX, incide não só na Física. Deixando a complexidade de lado, resumidamente pode se dizer que a Teoria da Relatividade afirma que o tempo não é igual para todos, podendo variar de acordo com a velocidade, a gravidade e o espaço. A relatividade saiu das garras da Física e se influenciou outros ramos de conhecimento. Não há, por exemplo, como se conceber hoje um pensamento que não preveja certo grau de variação, de concessão e de alternatividade justamente pela “relatividade das coisas”.

Neste novo contexto, os certos e os errados vão sendo amenizados. Nas boas conversas não mais são admitidas teses onde a certeza reside na bipolaridade. Céu ou inferno, paraíso ou tártaro, espírito ou matéria, bondade ou maldade, branco ou preto. Como tudo é relativo, entende-se comumente que a pobreza esconde-se na existência de duas únicas possibilidades para a solução de alguma questão. Ou seja, é mais racional e inteligente admitir que entre o céu e o inferno existam muitas outras possibilidades. Muitas delas não entendidas, não admitidas e nem mesmo percebidas pelos indivíduos que, por natureza, preferem a certeza da bipolaridade ou mesmo temem não controlar o vasto conteúdo que se abre e que pode gerar insegurança e incerteza.
Os velhos pensadores bem que preferem as dívidas. Dizem que não fossem as dúvidas a Terra ainda seria o centro do universo e perduraria até hoje a impossibilidade de se navegar pelos vastos oceanos, eis que monstros marinhos engoliriam as embarcações dando fim à valentia dos navegantes.
A ciência tem como mote a incerteza. Certo grau de desconfiança é necessária para que os pesquisadores busquem respostas. Então, as perguntas tornam-se mais interessantes do que as próprias respostas. Pode mesmo a incerteza, a dúvida, se tornar o combustível de uma boa pesquisa. E perguntar é uma arte. É arte de construção. Que o digam os filósofos, esses cientistas da indagação e da construção da sabedoria.
A própria religiosidade, quando abandona a bipolaridade e se permite transitar no ramo das possibilidades ganha com esta relatividade. O que mais fazem os doutrinadores é apresentar certezas e soluções prontas. Incentivam o medo fermentando o inimigo. Embaralham ideias complexas para torná-las simples com o intuito de ganhar a alma do crente. Dão o paraíso como certeza. Não restam dúvidas. Não há relatividade. Não há possibilidades outras que não estão estejam previstas, que não estejam impressas, que já não tenham sido ditas. O mundo, aparentemente, parou. Nada mais há de novo no front. Ou seja, já está tudo decidido porque assim se quis.

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