Em 2013, por ocasião dos 60 anos do GAO- Grêmio Atlético Osoriense participei de alguns trabalhos de resgate da história do clube. Um vídeo foi editado e um caderno no Jornal Bons Ventos. Na oportunidade, abordei a importância do clube no atendimento a alguns dos anseios dos jovens daquela época: entretenimento, festa e engajamento.
Eram outros tempos, outras preocupações, outra forma de encarar a vida.Segue a matéria que nasceu de uma entrevista com um dos idealizadores da boate Marshmallow, Neimar Pacheco.
O
verbete marshmallow é apresentado na Wikipedia como “um confeito
que, em sua forma moderna, consiste de açúcar ou xarope de milho,
clara de ovo batido, gelatina previamente amolecida em água, goma
arábica e flavorizantes, batidos até tomarem uma consistência
esponjosa”.
Na
década de 80 não havia Wikipedia. Em Osório, no entanto, o verbete
era por demais conhecido. Era sinônimo de festa, de juventude. Era
sinônimo de GAO.
Seu
idealizador, Neimar Pacheco, guarda na memória todos os ingredientes
que levaram à sua criação. “Não havia na cidade ponto de
encontro para os jovens. Fazíamos reunião dançante na garagem da
minha casa e juntava muita gente”, relembra, destacando que, quando
seu pai Vilmar Pacheco assumiu a presidência do clube, sentiu que
dali poderia surgir alternativa de entretenimento para aquele grupo
de amigos.
Em
1981, o grupo se reuniu na casa do presidente. Surgiu a ideia de
ampliar aquelas reuniões dançantes num espaço maior. O GAO
aparecia como o local ideal. Neimar lembra que tudo foi
acontecendo ao acaso. “Tivemos que partir para a improvisação.
Não havia som profissional, não havia DJ. Foi tudo sendo construído
conforme a necessidade”.
O
NOME
A
escolha do nome é um capítulo à parte. Durante a reunião de
criação da boate surgiram diversas sugestões como Galalau e Open
GAO . Um fato inusitado, no entanto, foi importante para a definição
do nome. Conta Neimar que seu irmão Vilnei, que participava da
reunião, foi até a geladeira e retirou de dentro uma embalagem.
“Que nome estranho esse” teria dito, mostrando o creme de
marshmallow. A sonoridade da palavra inglesa soou bem entre os
jovens. Colocada a sugestão em votação foi aprovada por todos.
Já
que tudo nascia ao som do improviso, a escolha do DJ também não
poderia ser diferente. Ocorre que todos os jovens queriam a liberdade
de poder dançar e namorar. Como ninguém queria comprometer a noite
toda animando os demais, coube ao autor da ideia a responsabilidade
pela escolha do repertório e por tocar a noite toda. “Sem querer
me tornei o DJ da festa”, lembra Neimar.
PAINÉIS
Como
o salão do GAO era muito amplo, surgiu a ideia de reduzir o
ambiente para torná-lo mais aconchegante. O grupo optou por montar
painéis coloridos reduzindo, assim, o espaço dando a impressão de
que a casa estava sempre cheia. Conforme Pacheco, a tarefa foi
coletiva. Muitas mãos colaboraram na tarefa.
Naqueles
tempos, quando o termo reciclagem ainda não estava em voga, a turma
do GAO foi politicamente correta. Como a boate do GESB havia sido
fechada, sobraram alguns painéis. A diretoria do clube coirmão os
doou aos meninos do GAO que,por sua vez, os utilizaram na
Marshmallow.
ALTERNATIVO
O
repertório da festa também cabe uma análise. Pacheco destaca que a
preocupação era tocar aquilo que a gurizada gostava. E o rock
estava em alta. Era o que os jovens preferiam. No entanto, se faziam
concessões. Neil Young, Bob Dylan, David Bowie, Rolling Stones e Led
Zeppelin.
Marcelo
Rech foi um dedicado auxiliar de Neimar. Ajudava na montagem de som e
de luzes. De quebra, vez por outra, especialmente quando havia algum
impedimento do DJ titular, ele assumia o comando do som. A
preferência era pelo rock. “Aproveitamos aquele período excelente
do rock nacional com Paralamas, Engenheiros, Kid Abelha, Barão
Vermelho e tantos outros”. Lembra que não tocavam só os singles.
“Tocávamos muito o lado B dos discos e isso agrava muito”.
UM FENÔMENO REGIONAL
Os
resultados dos primeiros tempos da Marshmallow foram satisfatórios.
O clima de amizade e respeito conquistou a cidade. Neimar Pacheco
acredita que contribuiu para isso a presença de casais mais velhos
para impor limites bem definidos à garotada. “Meu pai trabalhava a
noite toda. Ficava na beira da pista evitando que a gurizada dançasse
com copos na mão para evitar acidentes”, recorda.
A
esposa do presidente, Frânei Pacheco, por sua vez, também
permanecia no recinto. Tinha como função evitar os excessos dos
casais mais afoitos.
Com
o tempo, a boate do GAO foi tomando corpo. Ganhou uma dimensão
maior. Já não era mais a festa da turma do Neimar. Os jovens da
cidade se apropriaram da Marshmallow. A fama foi se espalhando.
Cresceu a presença dos jovens de municípios próximos. Depois
disso, a festa se abriu definitivamente. Na vinda para a praia,
vários meninos de Porto Alegre e de Novo Hamburgo se programavam
para passar por Osório e curtir a Marshmallow.
Ainda
hoje, passadas três décadas, Neimar Pacheco é surpreendido por
pessoas que dizem ter passado pela pista do GAO. “Já
fui abordado por pessoas que não conheço em Torres, em Porto
Alegre, que me perguntam: tu não és o cara de Osório, lá da
Marshmallow?”. Surpreso com as abordagens, Neimar não esconde que
muitas vezes se emociona quando lembra que a iniciativa daqueles
jovens rendeu frutos não só para os amigos de Osório, mas sim para
uma parcela significativa da juventude regional.
DAS PISTAS À AVENIDA
A
influência da Marshmallow não se restringiu à presença dos jovens
na boate. Conta Neimar Pacheco que, incentivados pela convivência
frequente, os jovens iniciaram uma série de ações que fortaleceram
o GAO em vários aspectos. Um deles foi a formação de um bloco
carnavalesco, que depois se transformou em escola de samba. “Acho
que isso serviu de incentivo para que o Patrocínio entrasse na
avenida, tornando o Carnaval de Osório um modelo para a região”.
“Aliás,
a relação entre as duas agremiações foi sempre muito positiva.”
Houve um ano em que o Patrocínio encontrava dificuldades. O GAO
destinou
a renda de uma boate para auxiliá-los”.
DO SALÃO PARA O FUTEBOL
A
convivência com tantos jovens, com tanta regularidade, foi
fundamental para que o esporte voltasse a fazer parte da proposta do
clube. Depois de 20 anos afastado dos campos, o GAO motivado
pela sua juventude retoma sua participação no Campeonato Municipal.
O ano era 1982. O time voltou a ser campeão. A renda da Marshmallow
auxiliava no financiamento das despesas.
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