24/11/2010

A ética em jogo

As rodadas finais do Campeonato Brasileiro têm suscitado alguns questionamentos que vão além do desempenho dos times, dos erros de arbitragem, dos desfalques, da tática empregada pelas equipes. No fechamento de mais uma edição do Brasileirão até a Filosofia entrou em debate. Antes que alguns doutos torçam o nariz, eu explico!
A fórmula da disputa, onde todos jogam contra todos em dois turnos distintos, está possibilitando que as equipes, além de depender de suas próprias forças, fiquem na torcida por algum clube rival. E quando se fala em rivalidade em futebol, o negócio é muito mais sério do que se imagina. Há torcedores que não são meros admiradores dos times. Elegem o futebol como uma religião. Erguem totens e os adornam com as cores do time. Não raro criam-se altares em casa. O time é tudo. É um caso patológico. Uma relação de amor e ódio, de vida e de morte.
Pois bem, neste cenário todo, a fórmula do campeonato conseguiu o que ninguém havia alcançado até então. Torcedores fanáticos, doentes, deixando seus times de lado, torcendo pela sua derrota. O objetivo é claro, evitar que o rival seja campeão. Convenhamos, isto é, no mínimo, esdrúxulo.
A lógica do futebol e dos esportes é de que os times façam força para vencer. Que busquem a vitória. A lógica manda que os torcedores incentivem a vitória, que vibrem com os gols de seu time. O que se tem visto é que torcedores estão vibrando quando sua defesa falha e entrega o gol. Ora, isto é muito grave! Alguém mais versado dirá - e com toda a razão – que na Europa a fórmula é a mesma e ninguém ousa fraudá-la. Dirá, ainda, com a mesma razão, que na Europa as equipes não se preocupam com os rivais. É verdade! Porém, o Campeonato Brasileiro não é disputado na Europa. Ele é nosso. E como tal tem os ingredientes que só nós conhecemos.
O futebol é mesmo um terreno difícil para a Filosofia, para pensar em ética e moral. As relações são rasteiras, são caudalosas. O que parece simples é um emaranhado. Os interesses são variados. O torcedor é apenas uma parcela, um ingrediente. E assim deve continuar. A paixão do torcedor deve permanecer na arquibancada. Quando muito dali sair como forma de determinação, de coragem, de ousadia para a vitória. Não devem os dirigentes, treinadores e jogadores jogarem o mesmo jogo passional do torcedor. O campeão deverá jogar para tanto. Não deve ser “ajudado” pelo corpo mole dos adversários. Mesmo que o torcedor assim queira.

Sabedoria
Num intervalo de um destes jogos, zapeando pelos canais, encontrei um documentário interessante no Canal Brasil. O diretor Eduardo Coutinho juntou sua equipe e sem prévia combinação deslocou-se até a cidade interiorana de São João do Rio do Peixe, onde filmou o belo “O Fim e o Princípio”. Na localidade agrícola de Sítio dos Araçás colheu depoimentos de pessoas comuns que falaram sobre suas preocupações, sobre a vida, família e religião.
É comovente ouvir o que esta gente sofrida fala. De suas bocas, invariavelmente banguelas, por vezes saem pérolas. Olhando para a lente com seriedade, um discorre sobre Deus, sobre a vida e a morte. Tenta explicar o que ocorrerá a cada um de nós quando chegar a hora final. Outro matuto esperto, simpático, sorridente, encarando a câmera com a intimidade de um Jim Carrey, discursa sobre a sabedoria. Depois de filosofar longamente sobre a vida, afirma com propriedade: “É o que penso que sei!”. “Será que sei?”, arremata com maestria socrática. De causar inveja, não é?   


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