21/06/2018

Jesus na Causa


A argumentação é uma arte. Arte complexa. Isso porque depende da capacidade do indivíduo em defender uma ideia e da capacidade de interpretação do outro. Faltando uma das condições, a coisa não funciona. A comunicação fica truncada. Nem  todo o argumento é válido. Alguns são desprezíveis.
Nos períodos eleitorais, os políticos carreiristas saem por aí vendendo seu peixe. Como de regra, tentam ser o que não são. Misturam-se ao povo, comem coisas como come o povo, mudam as vestimentas para parecer povo, falam como se povo fossem. Vão às feiras atopetadas de gente, abraçam indiscriminadamente, beijam crianças, dão tapinhas nas costas de João, de Zé e de Maria Ninguém. Um assessor ao lado vai dizendo os nomes dos eleitores para causar uma boa impressão. E o pior é que causa!
Nem só de feira se vive.  As igrejas, elas também, abriram suas portas para receber estes homens tão necessitados de luz e tão dedicados à causa da humanidade. Dia desses, um destes candidatos, aliás, cotadíssimo na corrida pelo primeiro posto da nação, levou seu grupo até uma dessas congregações. Desconfio que não se verá cena mais grotesca. Uma camiseta escrita Jesus servindo de embalagem para um discurso armamentista, retrógrado, homofóbico e chauvinista.
Ora, a lógica de Cristo era dar a outra face em caso de agressão, era amar incondicionalmente os diferentes, pois são filhos de um só Deus, era não julgar o outro porque não há quem não tenha errado antes. A lógica do candidato é bandido bom é bandido morto, é falar mal dos pretos, dos pobres, dos gays, das lésbicas e de todos aqueles que não se enquadram no seu mundinho militar. Como se vê, padrões bem distintos. Posições conflitantes.
Não considero importante o espectro religioso do político. Aliás, religião é ato de vontade, é pessoal e intransferível. Cada indivíduo tem o sagrado direito de ter seu próprio pensamento. A opção religiosa dos outros não me diz respeito. Se não tiver religião também não me importa. É problema ou solução de cada um.
Neste caso específico o que mais chama a atenção é a flagrante contradição entre a proposta do candidato e a filosofia religiosa. A exploração do meio através da facilitação de pastores que mais desejam o poder do que instruir de maneira altiva e desinteressada seu rebanho. As ovelhas seguem o pastor. E, às vezes, esses pastores mostram o abismo como se o paraíso fosse.
Mas, em campanha eleitoral vale tudo. Os candidatos sabem que o povo tem memória curta, se informa pelo Facebook, é incapaz de formular argumentos complexos e vai votar como se uma eleição fosse um jogo de futebol. Vai torcer para um candidato sem saber quem realmente ele é. E assim segue o jogo que nunca termina. No final, todos têm culpa e ninguém tem culpa alguma. Não se pode exigir conhecimento de quem não conhece nem honestidade de quem não tem.
                                                               

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