Deus Criando o Sol e a Lua- Michelangelo |
O sentimento religioso é
aquela sensação intrínseca, imanifestada, primitiva, que nasceu no
instinto e se perpetuou, chegando até o homem intelectualizado. É a
impressão da existência de um ser superior. Afirmam os estudiosos
do campo da antropologia espiritual que este sentimento, atualmente
racionalizado, nasceu com o próprio ser humano.
As primeiras manifestações
humanas em relação ao supremo foram ainda na fase pré-civilização.
O primitivo encontrava-se no subsolo do conhecimento. Projetava nas
coisas o seu sentimento dando vida ao inanimado. As experiências do
momento são representadas no material. Para alguns, a pedra foi o
primeiro objeto de adoração, naquilo que se chama de litolatria ou
adoração de pedras, rochas e relevos do solo. Depois a fitolatria,
adoração dos vegetais, plantas, flores, árvores e bosques;
seguindo-se da zoolatria, adoração dos animais e, posteriormente, a
mitologia, que é uma explicação rudimentar do funcionamento do
universo, através do componente mágico.
Os períodos foram sucessivos,
mas não foram registradas quaisquer formas de sobressaltos. A
evolução foi lenta, gradual e imperceptível. Os períodos
anteriores não foram desprezados, permanecendo sempre muitos
resíduos, que, em muitos casos, são percebidos até os dias
atuais.
A explicação, no entanto,
encontra opositores. O escritor italiano Ernesto Bozzano, abordando
os povos primitivos e as manifestações espirituais, revela que está
na vida cotidiana do homem a origem na crença da existência de um
mundo imaterial. Através dos sonhos, quando é possível a viagem ao
mundo desconhecido, o homem primitivo tomou contato com uma realidade
distante, a existência de um criador e a sobrevivência espiritual.
As religiões antigas foram
formadas a partir da observação da natureza. O homem era o deus
primitivo. Aliás, não poderia ser diferente. Ainda frequentando a
infância do conhecimento, o homem conhecia superficialmente o mundo,
as leis da natureza. Sua maior intimidade era consigo mesmo, ainda
assim, um parco conhecimento. Desconhecia a origem das emoções, dos
sentimentos, enfim, não tinha contato com o subjetivo.
Os deuses de então eram os
mortos. Afinal de contas, eles, libertos que se encontravam da
realidade corporal, podiam entrar nos mundos superiores. Entre
hindus, chineses, gregos, romanos e outros povos, a crença na
divindade humana é recorrente. Os mortos da família eram alvo de
devoção, de homenagens, de cuidados especiais. O fogo representava
o sentimento de dedicação. Os mortos governavam.
As famílias dedicavam honras
a seus mortos, temendo abandoná-los. Acreditavam que, esquecessem
seus mortos, e desgraças ocorreriam em seu meio. Safras mal
sucedidas, morte de animais, perda de entes queridos, morte de
escravos. Enfim, todos os desastres possíveis poderiam acontecer,
caso negligenciassem na homenagem aos seus deuses.
Com o passar do tempo, a
religião foi se modificando. Deixou o seio familiar. Os deuses já
não eram seres conhecidos, mas sim, criadores poderosos donos do bem
e do mal, prontos a elevar os mais fervorosos ao paraíso e relegar
os infiéis às dimensões mais densas do inferno eterno.
Nos dias de hoje, a discussão
religiosa é pauta política. Deus está no palanque. Na verdade,
homens colocam na boca da divindade seus preconceitos, seus
interesses, seus valores, suas ideias, buscando garantir um lugar ao
sol. O paraíso aparente apresenta de modo sutil o inferno que está
reservado aquele que não atende ao chamado.
Deus não está em campanha.
São homens que disputam o poder. São humanos que votam, que
escolhem seus governantes bons ou ruins. São os próprios eleitores
que depois sentem os efeitos da sua própria escolha. Deus não tem
culpa. Os homens têm.
Sobre deuses:
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