26/11/2014

Um filme

Os olhos se abrem. É cedo da manhã. Mais um dia começa para Leonel. É dia de Primavera.
Os pássaros já fizeram seu alarido. E isto começou muito antes de acordar. Aliás, a vida segue sempre. Não dá tréguas. 
O corpo descansou, é certo. Mas, a viagem foi grande. Tem sido grande. É estranho. Muito estranho pensa Leonel, lembrando que tem feito longos trajetos. Esteve em locais que não lembrava mais. Fez coisas que não sabia. E agora, quando acorda, a impressão que tem é a de que esteve atuando em um filme. Cenas de violência, de traição, de guerra, de amizade e de amor.
Porém, sente que este filme só foi visto por uma pessoa. E que sua atuação talvez não tenha sido das melhores. Que o roteiro não seja dos melhores. Que as histórias contadas não sejam das mais inspiradoras. Mas, a pior sensação é a de que não tem acesso a esta sala. E, de algum modo, sente com se houvesse certa injustiça no ar. Leonel gostaria muito de ver esta película. E, quem sabe, discuti-la. E, quem sabe, reinventá-la. Quem sabe refazer aquelas cenas que não ficaram boas.
Mas, no fundo sente que não há injustiça alguma. E, de algum modo, isto o chateia.
Independentemente disso, segue fazendo as coisas que deve. Faz as coisas que espera fazer, que os outros esperam que faça. Mas, não nega: seu peito sente. Sua garganta também. Seus olhos, tão seguros, às vezes falseiam.
Hoje, enquanto o cantor melancolicamente narrava o distanciamento da pátria, sua dor por ter sido afastado dos que o amam, sentiu um nó na garganta. Não sabe cantar. Apesar disso, Leonel, bem sabe o que o abate. Mas não sabe explicar. E, sem explicações, vê como é ruim perder as palavras. É como ser traído. É como deixar partir o último trem da noite e ter que esperar o dia seguinte na estação. É como se deixar levar e não conseguir voltar. Bem sabe Leonel que isto é passageiro. Tudo na vida passa. Mas, a sensação, ainda assim, não é das melhores.
Hoje é sexta-feira. É um Dia de Primavera. Seus olhos se abriram cedo da manhã. Segue fazendo o que tinha que fazer. Mesmo sem empolgação. Mesmo sem vibração.
A noite chegará e vai descansar novamente. Talvez possa ver o filme que não viu hoje. Talvez!
E, amanhã, quando abrir os olhos, os pássaros terão feito todo o seu alarido. E mais um dia começará para Leonel.

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