04/03/2015

Filhos de peixes

Woody Allen (arte sobre foto)
A mãe de Woody Allen nunca desejou um filho artista. Desejava, isto sim, que ele fosse um cara normal, que cursasse uma faculdade e que seguisse sua vida sendo infeliz como pudesse. Porém, Allen Sterwart Konigsberg nunca gostou de estudar. A escola era sua inimiga. E ele não fazia grandes concessões. Gostava de escrever. E para continuar anonimamente sua atividade prazerosa escolheu um pseudônimo. Escreveu roteiros para outros comediantes e foi empurrado para o palco , mesmo sendo desajeitado e não sabendo representar. Porém, depois de alguns pequenos sucessos e fracassos acabou se firmando como o mais legítimo representante do humor autodepreciativo, reflexivo e existencial contemporâneo.
O baiano Gilberto Gil tinha todas as ferramentas para ser um economista. E todos nós sabemos o quanto necessitamos de economistas, ainda nos dias de hoje. Passou no vestibular, matriculou-se na faculdade. Cursou algum tempo. Encontrou Caetano, Gal Costa, Tom Zé e Maria Bethânia. A faculdade foi arquivada. A economia ficou para trás. Felizmente para a música. Ainda hoje é um dos mais produtivos compositores e músicos do nosso querido torrão pátrio.
Charles Bukowski, o velho safado americano, trabalhou nos correios e em dezenas de empregos insignificantes. Entre uma bebida e outra, entre um amor bandido e outro, entre uma prisão e outra, entre um despejo por falta de pagamento e outro, entre um páreo e outro, escrevia poemas e contos eróticos para revistas masculinas. Demorou um bom tempo até ver seu talento minimamente reconhecido e, assim, conseguir pagar suas muitas cervejas e vinhos. Porém, um dia emplacou uma carreira literária expressiva. Tá certo que seu humor não melhorou muito. Continuou bebendo, com surtos depressivos que o levavam às beiras do suicídio, mas, ainda assim, genial até sua morte.
Certo é que muitos indivíduos não se conectam com as expectativas dos que os rodeiam. É normal que família de médicos deseje mais um médico, a de arquitetos espere ansiosamente por novos arquitetos e a de músicos o que mais queira é um músico para fortalecer a banda. Porém, em muitos casos, o que se vê é que filhos de peixes nem sempre peixinhos são. E das casas de ferreiros saem carpinteiros e das de engenheiros advogados e das de advogados excelentes terapeutas ou professores ou poetas. A vida é dinâmica disse alguém e com toda a razão. Não houvesse ousadia por aqui, tentativas e erros por lá e estaríamos repetindo tudo o que foi feito de certo e de errado pelos homens das cavernas. Viveríamos tal qual nossos pais e nossos avós. Sem tirar nem por.

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