Imagine aquele indivíduo que fala a verdade o tempo todo. Que mantém seu censo crítico aceso durante as 24 horas do dia. Incapaz de falsear um segundo sequer. É o estraga-prazeres da turma. Mantém o pé na realidade sem ao menos dar uma passinho na fantasia. Azedume puro. Chato para dizer pouco. Pior ainda se não mantiver certa discrição na suas manifestações agourentas.
Porém, fantasiar é conceder. É amenizar. É acreditar no impossível. É fazer vistas grossas ao corriqueiro, ao normal, ao esperado.
Não há tempos mais mágicos do que estes do final de dezembro. Pelo menos para a grande maioria das pessoas. A esperança, tão comum nas propagandas da tevê que alardeiam novos tempos e forças renovadas para construção de um futuro cheio de realizações, parece ser recepcionada por parcela significativa dos humanos. Em alguns momentos parece mesmo que a realidade vai dando espaço à magia, implementada pelas vibrações leves emanadas pelas mentes e corações de seres bem intencionados.
Lamento informar, diria o cético, conectado com a visão racional das coisas, “boa parte dos propósitos traçados neste período terão vida curta”. Ou seja, muito do que se planeja morrerá na casca. O clima de fantasia será superado pela realidade nua e crua já nos primeiros dias de janeiro. Francamente, há algo mais desanimador do que isso?
De algum modo todos nós somos capazes de manter estes dois indivíduos pulsando dentro de nós. Um deles, cético e antenado com a realidade, vai alertando dia após dia que os passos fantasiosos que vamos dando estão nos levando para um mundo ficcional. É o que nos trás de volta à realidade quando sonhamos. É o crítico quer não aceita devaneios.
É o certinho que precisamos ser às vezes. O outro, romântico, esperançoso, vai dando vazão ao mágico, seguindo o caminho da fantasia, fazendo concessões, permitindo a convivência com as pequenas falsidades, com as hipocrisias do dia a dia, sem maiores altercações e ressentimentos.
O comum, o desejável, é que conquistemos a sabedoria de dar corda hora a um, hora a outro. Sem traumas. Evitando o investimento demasiado no ceticismo, sob pena de se construir uma existência sombria, nem abandonando a realidade pela vontade de que a magia e a fantasia resolvam tudo, como bem faz nosso lado infantil.
E assim seguimos nossa caminhada. Com açúcar e afeto, mas com uma pitada de sal e pimenta para aqueles que assim desejam.
Por derradeiro, indispensável agradecer os nossos leitores, especialmente aqueles que acompanharam nossa história neste ano.
Um bom ano a todos. Que sejamos cúmplices neste 2014 que se inicia.