15/09/2011

Nos tempos das cartinhas

Houve um tempo em que o meio mais rápido de comunicação entre seres separados por léguas de distância era através de uma missiva, uma carta. Os mais jovens, com certeza, desconhecem o que vem a ser tal coisa. Vamos então ao insubstituível e insuperável dicionário. Lá está a definição de carta: "escrito que se envia a outrem com cumprimentos, pedido, ordens, notícias etc.; epístola, missiva".

O processo de envio de tal correspondência iniciava com a compra de papel adequado e de um envelope padrão. Depois, o escriba haveria de queimar os neurônios para escrever os seus sentimentos, suas apreensões, suas desconfianças, as notícias e os pedidos. Acabado o texto, normalmente após o amassamento de um bom número de folhas de papel, - descartadas por alguma impropriedade, algum borrão, algum arrependimento oportuno-, seguia-se o envelopamento, com o preenchimento do emitente e destinatário com seus endereços legíveis.
Tudo fechadinho, coladinho, era hora de ida até uma agência dos Correios. No local, um selo era comprado, prudentemente lambido na sua face colante e, depois, colado no local apropriado. Após era só esperar que as notícias quentinhas, os sentimentos fresquinhos ou a paixão alucinada viajasse por dias e dias seguidos até que a mão do carteiro entregasse a carta ao seu destinatário.
Não era muito incomum que as cartas, especialmente aquelas de amor, fossem interceptadas por terceiros visando cortar a comunicação entre os amantes, esfriando assim a relação, que naqueles tempos não era assim tórrida e intensa. Muitas jovens amadas, após o casamento arranjado pelo pai, tardiamente descobriam que a família em conluio havia providenciado no furto das missivas. Ali, nas cartas que não chegaram, encontravam-se, talvez, verdadeiras obras de arte, grandes produções amorosas de alguém que, do outro lado, sofria a dor do abandono, a frustração e o desencanto de um amor não correspondido.
Quantas palavras de amor desperdiçadas. Quantas juras de amor eterno que não se consolidaram pelo afastamento providenciado por quem não deveria e, moralmente, não poderia interferir. Quanta energia criadora reprimida pelo ato cruel e criminoso de cortar a comunicação daqueles que tanto se queriam.
Com o tempo, as cartas foram perdendo espaço. Outros meios mais rápidos de comunicação foram surgindo. O telegrama e o fonograma eram mais rápidos, econômicos e resumidos. Serviam mais para anunciar a morte de alguém, uma notícia curta do que para difundir palavras de amor.
O telefone, que chegou bem depois, revolucionou de maneira indelével este processo. Foi quem melhor cumpriu com o papel de intermediário da comunicação. As linhas levam para lá e para cá a voz dos amantes, com seus suspiros e seus longos silêncios. Os pais, então, perderam de vez a grandiosa chance que tinham de debelar uma paixão.
Agora tudo é rápido e rasteiro. Melhor que uma carta é um torpedo, um e-mail ou uma mensagem numa rede social. Porém, com toda essa pressa, carece espaço para a poesia e para a boa produção textual. Nem tudo é arrasador, nem tudo é desencanto, porém. A manifestação dos jovens contra a corrupção instalada no Brasil desde que Cabral por aqui chegou é um raro exemplo de uso eficaz da rede. Ver estes meninos gritando por um Brasil melhor é comovente. Mesmo que seus gritos já tenham sido superados por um bilhão de novas informações, resta o sentimento de que sempre é possível lançar palavras construtivas nesse meio asséptico e impessoal que é a internet.

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