11/04/2013

Direito ao esquecimento


O ex-presidente João Batista Figueiredo, o último presidente militar da ditadura brasileira, pediu para ser esquecido. Em uma entrevista disse que preferia o cheiro dos seus cavalos ao do povo. Muito embora negue peremptoriamente, Fernando Henrique Cardoso, também ex-presidente, teria pedido aos brasileiros que esquecessem o que ele havia escrito nas décadas anteriores ao seu governo. FHC desmentiu, mas ficou o sentimento de que ele queria realmente que suas teses, publicadas em inúmeras obras, não embasassem julgamentos críticos de seu governo.
Homens públicos vivem na corda bamba. Todo o cuidado é pouco. Uma palavra mal colocada pode gerar um passivo de difícil superação. 
Nos dias atuais a preocupação deveria atingir a todos. As redes virtuais são os meios mais comuns de difusão de pensamento. Ao longo dos tempos, tudo aquilo que está postado, curtido, compartilhado vai construindo um histórico do indivíduo. Meninos e meninas, inexperientes, confiantes no senso de humor, na galhofa momentânea não se dão conta de que o ambiente virtual é traiçoeiro. Não sabem que a rede que os recebe hoje, amanhã vai colocá-los como que diante de um espelho. E o pior, completamente nus. Os comentários fúteis, preconceituosos, a gracinha momentânea, vão, silenciosamente, constituindo um prontuário que, fora do contexto, dará uma ideia da personalidade do indivíduo, o que é chamado no meio virtual de perfil.
A zoação, a gozação inconsequente, hoje conhecidos sob o manto do verbo “trollar”, uma marca desta geração que já nasceu com os olhinhos encarando as mídias eletrônicas, são brincadeiras infantis que repercutirão algum dia. O riso, a graça de agora pode virar o azedume e o transtorno do dia de amanhã.
Na Europa se discute o direito ao esquecimento. Ocorre que todos nós temos a oportunidade de emitir opiniões e depois reconsiderar. No mundo virtual, onde o que importa é o instantâneo, a rapidez, as informações são geradas às pilhas. Porém, nem sempre é possível retornar à postagem e retomar o debate, reconsiderando e reavaliando. A mídia dos nossos dias suprime o arrependimento.  
Agora se chega à conclusão que essa situação é perniciosa, é prejudicial ao ser humano, pois anula o sagrado direito de repensar, de refazer, de reconstruir uma situação embaraçosa. Ocorreu com uma jovem inglesa que, do alto dos seus 14 anos de idade, comentou no Twitter situações relacionadas à sexualidade demonstrando preconceito, ao racismo e ao consumo de drogas. Mesmo que seus “tuítes” tenham sido apagados, os comentários mais polêmicos foram replicados em outras plataformas e o estrago está feito.    
O uso de uma linguagem estúpida e imoral, como ela mesma definiu, foi resultado do seu arroubo juvenil, de sua inconsequência. Naquele tempo, ela, como tantos outros meninos e meninas nos momentos atuais, não tinha ainda a percepção de que o mundo vai muito além de seu próprio umbigo. Participando de fóruns, de debates, lançava o verbo com a fome de uma traíra que vê a isca e não vê o anzol. 
O costume é mais comum do que se imagina. Muitos marmanjos se lançam a usar as redes sociais de modo folgado, sem freios, sem censura. Poluem o ambiente com linguagem chula, vulgar. Acham engraçado. Riem, se divertem.  Mordem a isca com voracidade. 
Talvez num futuro muito breve nossa história será contada pelas nossas manifestações nas mídias eletrônicas. Não sei quando. Porém, ao que consta caminhamos decisivamente para isso. Controle, moderação e caldo de galinha não fazem mal a ninguém.   

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